Jurandir Pacífico, filho de Mãe Bernadete, fala sobre assassinato da líder quilombola: ‘Tem gente grande por trás’.

No último domingo (20), a família de Mãe Bernadete foi retirada do quilombo por questões de segurança.

“Naquela noite, minha família ouviu uma batida na porta. Ninguém respondeu. Quando ouviram uma segunda batida, minha mãe mandou o mais novo ver quem era. Dois homens entraram de capacete. Pegaram os celulares de todo mundo, trancaram as crianças nos quartos. Depois fuzilaram minha mãe”. É o que contou Jurandir Wellington Pacífico, filho de Mãe Bernadete, líder quilombola de 72 anos executada com 22 tiros no Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, na última quinta-feira (17/8).

Em depoimento à revista Piauí, Jurandir, falou sobre o momento em que descobriu que mais um familiar próximo havia sido assassinado: em 2017, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, filho de Mãe Bernadete e irmão de Jurandir, também foi assassinado, e o crime segue sem solução. Os dois crimes estão sendo investigados pela Polícia Federal, mas ninguém ainda foi preso.

Segundo Jurandir, o irmão, mais conhecido como Binho, foi assassinado por causa de uma disputa por território. Em 2017, a Prefeitura de Simões Filho informou que construiria um lixão na região do quilombo, e Binho foi contra. Já nessa época, ele começou a receber ameaças de morte:

“Binho, além disso, ia se candidatar a vereador. Quiseram eliminar Binho antes da eleição, porque se virasse vereador seria mais difícil executar [a obra do lixão]. Foi realizada uma audiência pública sobre o lixão no dia 3 de setembro de 2017. Conseguimos embargar a obra. No dia 19, mataram Binho. Faz seis anos que a gente espera a polícia elucidar o caso. Entreguei para eles todas as informações que nós tínhamos, até a foto de um suspeito. É possível que agora eles tenham voltado a investigar, depois da morte de Mãe Bernadete. Mas acho que, para não terem feito nada até agora, é porque tem gente grande por trás”.

Mãe Bernadete, como conta Jurandir, não nasceu no quilombo, mas foi levada para lá aos 4 anos de idade. No espaço, criou os dois filhos biológico e adotou mais quatro. Enquanto viveu, a Yalorixá lutou para desenvolver o Quilombo Pitanga dos Palmares, e conseguiu: hoje, os moradores do local já tem acesso a uma creche e uma escola. “A Caipora, região onde aconteceu o crime, é uma parte mais rural do quilombo, onde fazemos o plantio. Antes não tinha nem energia ali. Minha mãe e meu irmão é que mudaram isso”, relembra.

MISSA

Na manhã desta quinta (24/8), aconteceu a missa de 7º dia de Mãe Bernadete. Muita gente compareceu ao evento religioso, que foi realizado na Basílica do Senhor do Bonfim. Além de líder quilombola e religiosa, a Yalorixá foi coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ), e viajava a Brasília constantemente. “Minha mãe sempre foi líder. Todo mundo que é do movimento negro ou do movimento quilombola conhecia minha mãe”, comenta Jurandir.

SEGURANÇA

No último domingo (20/8), a família de Mãe Bernadete foi retirada do quilombo por questões de segurança. Porém, Jurandir garante: o espaço não será abandonado. “Somos articulados, e vai ter gente tomando conta do quilombo de perto. Continuarei ajudando essas pessoas e irei até lá quando possível, mas escoltado. A comunidade está em prantos. Mas, o legado continua”.

Foto: Arquivo pessoal

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